Instituição Financeira Explorar a Gestão da Folha de Pagamento do Funcionalismo Público Municipal
0002.0000.9565/2016 direito administrativo - licitação deserta – gestão de folha de pagamento – possibilidade de contratação direta.
À
Prefeitura Municipal
Aos cuidados de
Data da consulta: 24/11/2016
Data da resposta: 05/12/2016
Consulta nº. 0002.0000.9565/2016
Questionamento:
Há o risco do Município realizar uma contratação direta com a Caixa Econômica Federal para gestão da folha de pagamento e arrecadação de tributos?
Nós já realizamos um procedimento licitatório, mas foi deserto.
Conclusão:
1. DA CONSULTA FORMULADA
Trata-se de consulta na qual a Consulente traz questionamento acerca de instituição financeira explorar a gestão da folha de pagamento do funcionalismo público municipal e arrecadação de tributos.
Aduz que o procedimento licitatório foi devidamente realizado, restando deserto.
Assim, questiona sobre a possibilidade de a Administração Municipal firmar contrato para a prestação dos referidos serviços junto à Caixa Econômica Federal por meio de contratação direta.
2. DO CERTAME LICITATÓRIO
O certame licitatório é um procedimento administrativo formal e que tem como escopo proporcionar à Administração a aquisição, a venda, ou a prestação de serviços da forma mais vantajosa, respeitando-se os princípios constitucionais da legalidade, isonomia, impessoalidade, moralidade e publicidade.
A licitação visa garantir a moralidade dos atos administrativos e dos procedimentos da Administração Pública, e também a valorização da livre iniciativa pela igualdade no oferecimento da oportunidade de prestar serviços, bem como de comprar ou vender ao Poder Público.
Sucintamente, HELY LOPES MEIRELLES em sua obra Direito Administrativo Brasileiro, 32ª. edição. Malheiros Editores, 2006, p. 271/272, definiu:
"Licitação é o procedimento administrativo mediante o qual a Administração seleciona a proposta mais vantajosa para o contrato de seu interesse”.
Segundo o entendimento de CRETELLA JÚNIOR:
"Licitação, no Direito Público brasileiro atual, a partir de 1967, tem o sentido preciso e técnico de procedimento administrativo preliminar complexo, a que recorre a Administração quando, desejando celebrar contrato com o particular, referente a compras, vendas, obras, trabalhos ou serviços, seleciona, entre várias propostas, a que melhor atende ao interesse público, baseando-se para tanto em critério objetivo, fixado de antemão, em edital, a que se deu ampla publicidade".
Ademais, é sabido que, no Direito Administrativo Brasileiro, a regra é a obrigatoriedade de licitação tanto para aquisição de bens como para que haja prestação de serviços para a Administração, tendo como fundamento legal a norma constitucional prevista no art. 37, XXI da Lei Maior:
“Artigo 37: A Administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
[...]
XXI: “ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações”.
E na norma infraconstitucional, o art. 2º da Lei n.º 8.666/93, prevê o seguinte teor:
"Art. 2º. As obras, serviços, inclusive de publicidade, compras, alienações concessões, permissões e locações da Administração Pública, quando contratadas com terceiros, serão necessariamente precedidas de licitação, ressalvadas as hipóteses previstas nesta lei".
Desse modo, a contratação com afastamento de licitação é uma exceção e, como tal, deve ser interpretada de forma restritiva e fundamentada exclusivamente nas hipóteses previstas em lei nos termos do dispositivo constitucional invocado. A Administração Pública, ao pretender realizar qualquer contratação, seja de prestação de serviço, fornecimento de bens, deve obrigatoriamente realizar o certame licitatório, quando não abranger as hipóteses de dispensa ou inexigibilidade previstas na lei 8.666/93.
3. DO CERTAME LICITATÓRIO DESERTO
Nesse momento, chegamos ao cerne da questão, qual seja, a necessidade ou não de realização de certame licitatório prévio para a contratação de instituição financeira para explorar a gestão da folha de pagamento do funcionalismo público municipal.
Deve-se atentar ao que foi relatado pelo Consulente no sentido de que o procedimento licitatório foi realizado, não tendo se verificado interessados.
Remetendo ao caso em tela, verificamos a hipótese legal da dispensa licitatória em face da chamada “licitação deserta”, capitulada no inciso V do artigo 24 da Lei n. 8.666/93, verbis:
Art. 24. É dispensável a Licitação:
[...]
V – quando não acudirem interessados à licitação anterior e esta, justificadamente, não puder ser repetida sem prejuízo para a administração, mantidas, neste caso, todas as condições preestabelecidas.
Analisando o texto do dispositivo transcrito, é fácil visualizar que a ausência de interessados em participar de licitação regularmente processada conduz a uma situação administrativa de possibilidade de contratação direta.
Nesse liame, impende lembrar a diferença entre licitação deserta e licitação fracassada. A licitação deserta ocorre em virtude da ausência de licitantes no ato convocatório e a fracassada quando os licitantes, por seu turno, atendem ao chamado, mas são refutados pela Administração, seja porque foram inabilitados ou tiveram suas propostas desclassificadas.
No mais, independentemente da classificação dada, a Administração deve rever seus atos para que verifique se não há cláusulas ou condições restritivas à competição, e, no caso de ser constatado qualquer vício de ilegalidade que tenha afastado os interessados ou propiciado a licitação fracassada, deverá a Administração anular o certame, realizando novo procedimento, sem os vícios detectados na anterior.
Nessa direção, segue o entendimento do TCESC:
As disposições da Lei Federal n° 8.666/93 relativas à dispensa de licitação devem ser interpretadas restritivamente, pois a regra geral é a realização do processo licitatório, consoante mandamento do artigo 37, XXI, da Constituição Federal e artigo 2° da citada Lei.
A dispensa de licitação com fundamento no inciso V do artigo 24 da Lei Federal n° 8.666/93 só é admissível quando nenhum interessado apresentar envelopes de documentação de habilitação e proposta de preços – licitação deserta. Não cabe a dispensa quando todos os participantes foram inabilitados ou desclassificados – licitação fracassada –, sujeitando a Administração à repetição do certame. (TCESC; Prejulgado nº. 822; Relator Conselheiro Antero Nercolini; Sessão: 22.05.2000; Publicado em 30.08.2000).
Como sabiamente relatado pelo órgão Consulente, o caso em tela trata de licitação deserta. Contudo, não basta o simples desinteresse pela licitação para a caracterização do instituto da dispensa licitatória. Nos dizeres de MARÇAL JUSTEN FILHO, para caracterizar a dispensa de licitação pela deserção, necessária se faz a presença dos seguintes elementos:
“O primeiro é a realização de licitação anterior, concluída infrutiferamente. Pressupõe-se, portanto, uma situação que originariamente comportava licitação, a qual foi regularmente processada.
O segundo é a ausência de interessados em participar da licitação anterior, o que provocou a frustração da disputa.
O terceiro é o risco de prejuízos se a licitação vier a ser repetida. A Administração estaria obrigada a renovar o processo licitatório, na sua etapa externa. No entanto, verifica que a repetição dos atos acarretaria prejuízos ao interesse buscado pelo Estado. Os prejuízos a que se refere o inciso não têm natureza idêntica aos do inc. IV. Se o inc. V estabelecesse requisitos idênticos aos do inc. IV, seria inútil e desnecessário. Não se exige um prejuízo irreparável ou a periclitação da integridade ou segurança de pessoas etc. O vocábulo “prejuízo” apresenta, naquele dispositivo, significação muito mais ampla do que possui no inc. V. essa situação pode permitir, em grande parte dos casos, a utilização da cotação eletrônica, sujeita à disciplina do art. 4º, §2º, do Dec. Fed. nº. 5.450/2005 [...].
Por fim, a contratação tem de ser efetivada em condições idênticas àquelas da licitação anterior. A contratação direta é autorizada no pressuposto de inexistirem outros interessados em realizar a contratação nas condições estabelecidas no ato convocatório anterior. Portanto, a alteração das condições importaria ofensa ao princípio da isonomia. É óbvio que não serão alteradas as condições do ato convocatório anterior quando os preços forem elevados para compensar inflação”. (JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 12ª edição. São Paulo: Dialética. 2008, p. 298).
Nessa esteira, tem-se que a licitação é dispensável a um dado negócio se ao processo licitatório correspondente, anteriormente realizado, não acudiram interessados, denominando-se licitação deserta.
Para caracterizar a “licitação deserta”, é necessária a soma dos elementos: desinteresse, prejuízo e mesmas condições, passível de apropriação da regra da dispensa licitatória do inciso V do artigo 24 da Lei n.º 8.666/93, desde que comprovadamente não se possa repetir o procedimento sem prejuízo à Administração. Não é outro o entendimento do Tribunal de Contas de Santa Catarina:
Na hipótese de não acudirem interessados à licitação anterior, e esta, justificadamente não puder ser repetida sem prejuízo para a Administração, é admissível a contratação direta, via dispensa de licitação, mantidas as condições estabelecidas no edital que lhe serviu de baliza, inclusive quanto ao prazo, nos termos do inciso V do artigo 24, observada a prescrição do artigo 26, ambos da Lei Federal n° 8.666/93. (TCE/SC. Prejulgado nº. 344; Relatora Auditora Thereza Apparecida Costa Marques; Sessão: 18/12/1995).
No que concerne ao prejuízo, destacamos que para “realizar segunda convocação para outra licitação trará prejuízo para a administração, seja em conseqüência do retardamento da execução do objeto, que poderia paralisar o serviço dele dependente, ou em função do aumento do custo, ao valor superior da força da verba destacada para atender as despesa; seja qual for o fundamento do prejuízo, haverá de ser explicitado, posto que a lei exige que a Administração justifique a inconveniência de repetir a licitação, o que equivale a apontar, concretamente, o prejuízo que dela resultaria” (PEREIRA JUNIOR, Jessé Torres. Comentários à Lei da Licitações e Contratações da Administração Pública. 6ª edição, 2003).
Ainda no que toca à hipótese de ausência de interessados, prevista no inciso V do artigo 24, oportuno transcrevermos a advertência lançada por MARÇAL JUSTEN FILHO:
“Não se aplica o dispositivo quando a licitação anterior foi eivada de vício e daí derivou sua anulação. A razão de ser do dispositivo do inc. V não reside na urgência da contratação. Se houver urgência, aplica-se o inc. IV. A previsão do inc. V retrata, em grande medida, dispositivo fundado no principio da economicidade. O problema não é realizar a licitação, mas repetir uma licitação que já foi processada regularmente, sem que despertasse interesse dos particulares. Há uma presunção de inutilidade de repetir licitação: se ninguém acorreu à anterior, por que viria a participar da nova? Haveria desperdício não apenas do tempo, mas também de recursos públicos. Logo, se a licitação anterior era viciada, não é possível extrair tal presunção. Assim, suponha-se que os prazos mínimos de publicidade não tenham sido cumpridos e ninguém tenha comparecido para formular proposta. Anulada a licitação, não é admissível a contratação direta com base no inc. V. Em suma, a aplicação do inc. V pressupõe a validade e regularidade da licitação anterior.
Como regra, revogação da licitação não autoriza aplicação do disposto no inc. V. A revogação pressupõe ocorrência de evento superveniente, que acarreta a inconveniência da manutenção do ato anterior. Logo, se a inconveniência não propiciava a continuidade de licitação anterior, é impossível promover a contratação direta segundo o mesmo modelo.
Suponha-se, porém, que a licitação terminou sem qualquer interessado e a Administração encerrou o procedimento através de um ato de ‘revogação’. Nada impedirá que, verificando posteriormente a existência de interessados em realizar a contratação nas exatas condições previstas na licitação passada e verificados os demais pressupostos do inc. V, a Administração promova contratação direta”. (JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 12ª edição. São Paulo: Dialética. 2008, p. 298). (Grifamos).
Analisando a narrativa colacionada à consulta, presume-se que foram tomadas todas as providências concernentes à ampla divulgação do certame, atendendo rigidamente as exigências legais, não se caracterizando, desse modo, nenhuma causa passível de nulidade, no que tange ao princípio da publicidade.
Por isso, entendemos que, no caso em tela, a Administração deverá declarar o certame deserto, mediante elaboração do termo de deserção.
Repise-se, ainda, que, de acordo com princípio da publicidade e da transparência dos atos administrativos, este termo deve ser publicado na imprensa oficial, de tal modo que possa produzir os efeitos obrigatórios.
No mais, uma vez que persiste a necessidade inafastável da contratação de empresa que realize os serviços gestão da folha de pagamento do órgão Consulente e arrecadação de tributos municipais, autoriza-se a contratação direta de empresa desse ramo, com base no que autoriza o artigo 24, V da Lei nº. 8.666/93, comprovada pelas duas tentativas anteriores, amplamente publicadas, mas a que não acudiram nenhum interessado.
Por derradeiro, cumpre destacar que a contratação direta deve obedecer todas as regras atinentes à dispensa. Precisa em especial estar respaldada no comprovado prejuízo a ser enfrentado pelo órgão, em face da carência do serviço objeto da licitação deserta. Ademais, a contratação com dispensa de licitação deve manter todas as condições constantes no instrumento convocatório anterior e com a justificativa do preço do art. 26, parágrafo único, inciso III, da Lei nº. 8.666/93.
4. CONCLUSÃO
Diante do acima exposto, este Centro de Estudos da Administração Pública conclui que, sendo declarada deserta a licitação, poderá haver a contratação direta de qualquer instituição financeira, ou seja, pública ou privada, conforme autoriza o artigo 24, inc. V, da Lei 8.666/93.
Deve-se, todavia, atentar para todas as regras procedimentais apresentadas no teor do presente parecer a fim de se evitar eventuais apontamentos pelos órgãos de controle da Administração.
É o parecer.
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