Ministra critica Defensoria e vota por permitir execução individual de acordo de Brumadinho
O alerta foi feito pela ministra Nancy Andrighi, do Superior Tribunal de Justiça, ao apresentar seu voto no julgamento da 2ª Seção que visa decidir se as vítimas do desastre ambiental podem agir de forma autônoma para receber a indenização prevista.
A ministra leu voto-vista e abriu a divergência por entender que a execução individual é plenamente cabível. Relator do recurso, o ministro Antonio Carlos Ferreira votou contra essa possibilidade.
O julgamento foi interrompido por pedido de vista do ministro João Otávio de Noronha. Até o momento, outros dois integrantes da 2ª Seção votaram para acompanhar a divergência: Humberto Martins e Daniela Teixeira. O julgamento está com placar de 3 a 1.
TAC sobre Brumadinho
O TAC em questão foi firmado menos de quatro meses depois do rompimento da barragem em Brumadinho e tratou das indenizações individuais a serem pagas pela mineradora.
A cláusula 15.7 do acordo previu pagamento de R$ 100 mil e pensão a cada vítima com dano à saúde mental/emocional, desde que haja incapacidade comprovada.
Vítimas do desastre têm tentado executar individualmente o TAC para receber a indenização. Elas apresentam laudos produzidos por médicos particulares indicando os danos e destacando o descumprimento do acordo por parte da Vale.
Até o momento, a única corte de segundo grau que admitiu essa possibilidade foi o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, o que gerou uma série de recursos ao STJ.
Tanto a Vale quanto a Defensoria Pública mineira entendem que o TAC não é um título executivo judicial. Ele é tratado como um documento para dar parâmetro às indenizações, ou seja, para facilitar a resolução mediante acordo, com valores mínimos e razoáveis.
No STJ, só a 3ª Turma chegou a julgar o tema colegiadamente. Primeiro, ela entendeu que só a Defensoria Pública poderia iniciar a execução. Quinze dias depois, porém, mudou de ideia e deu às vítimas a possibilidade de fazer a cobrança individualmente.
Legitimidade das vítimas
Não há dúvidas sobre a eficácia de título executivo extrajudicial conferida ao TAC, conforme preveem a Lei da Ação Civil Pública, a Lei Orgânica da Defensoria Pública e o Código de Processo Civil.
A divergência se baseia na possibilidade de as vítimas de Brumadinho representadas pela Defensoria iniciarem a execução individualmente. A alternativa seria exigir que apenas a instituição fizesse a execução, ao constatar o descumprimento do acordo pela Vale.
A afirmação feita na sustentação oral da Defensoria Pública mineira de que o TAC não foi pensado para ser usado como título executivo reverberou na posição adotada pela ministra Nancy Andrighi.
“Se esse título não é executivo extrajudicial, por que a Defensoria perdeu tanto tempo fazendo essa transação?”, indagou. Para ela, afastar a legitimidade das vítimas contradiz o objetivo do sistema de proteção da coletividade.
“Se o termo não pode ser executado e as vítimas permanecem a sofrer as consequências sem qualquer compensação, a sua realização constitui, em verdade, um ato meramente simbólico para dar notícia midiática.”
Papel da Defensoria Pública
Na análise de Nancy, se o ato negocial firmado entre as partes trata de direitos individuais homogêneos, nada impede que os próprios lesados executem o título extrajudicial individualmente. “Senão ele não tem sentido”, reforçou.
Além disso, ela defendeu que não cabe impor às vítimas a comprovação de que a Vale descumpriu o termo de compromisso para permitir a execução, sob pena de imputar à parte mais vulnerável da relação a responsabilidade pela prova negativa.
“A empresa executada apresenta melhores condições de comprovar que está adimplindo as disposições do acordo, o que poderá ser suscitado em sede de embargos do devedor”, explicou.
O voto, por fim, reconhece a celeridade das partes em firmar o acordo e a cooperação da Vale na busca por indenizar as vítimas, registrando que nove mil pessoas já foram beneficiadas. Mas reforçou as críticas.
“A proposta interpretativa das Defensorias, de que o instrumento não constitui título executivo, não beneficia efetivamente os destinatários da sua tutela, mas, em verdade, busca reforçar o poder da instituição, que permanecerá como uma intermediária indispensável e perpétua do direito de ressarcimento de outrem, o que não se pode permitir.”
Teses
Como o processo é julgado em sede de incidente de assunção de competência (IAC), seu resultado será vinculante, com fixação de tese jurídica.
A ministra Nancy Andrighi propôs a seguinte tese:
O termo de compromisso firmado entre a Defensoria Pública, o estado de Minas Gerais e a Companhia Vale as constitui título executivo extrajudicial, tendo as vítimas legitimidade para executá-lo individualmente.
Já o ministro Antonio Carlos Ferreira sugeriu a seguinte tese:
1) O termo de compromisso firmado entre a Defensoria Pública do estado de Minas Gerais e a companhia Vale S.A. não constitui título executivo extrajudicial para execução diretamente pelas vítimas;
2) As vítimas não têm legitimidade para executar individualmente em referido termo de compromisso.
REsp 2.113.084
Por: Consultor Jurídico
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