CP - Possibilidade de efetuar a contratação do defensor dativo
Direito administrativo – processo administrativo disciplinar – fundamento no 5º, inciso LV, da CF/88, além dos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, eficiência, ampla defesa, formalismo ponderado e o principio da verdade material – revelia da investigada – impossibilidade de contratação de advogado para apresentar defesa – realização da defesa da investigada pelo quadro de Advogados permanentes da Prefeitura ou por sua Assessoria Jurídica - não existe a obrigatoriedade de defesa técnica (sumula vinculante nº 5 do STF), podendo ser designado qualquer funcionário da Edilidade que se incumba da defesa da indiciada.
RELATÓRIO DE CONSULTA
À
Câmara Municipal de Dobrada
Aos cuidados da Dr. Emerson Tadeu
Data da consulta: 05/05/2020
Data da resposta: 08/05/2020
Consulta nº. 0002.0000.9831/2020
Questionamento:
Existe no âmbito municipal Processo Administrativo Disciplinar instaurado, para apuração de faltas cometidas por servidor público, em desfavor de uma servidora detentora de cargo efetivo municipal. Com efeito, transcrevemos a seguir um breve relato, visando uma análise por parte dos competentes profissionais que integram essa empresa:
I – Após toda tramitação processual, foi concedido à parte investigada, o 1º prazo para apresentação de defesa a ser apresentada em 10 dias úteis, considerando que a data da juntada do AR (protocolo de recebimento) foi em 19/02/2020, logo, o prazo de entrega da defesa final seria em 09/03/2020;
II – Isto feito, em atenção ao pedido do procurador da investigada, datado de 20/02/2020, onde foi juntado atestado médico com afastamento das atividades por 20 dias, sendo a data do retorno do procurador da investigada ao trabalho seria tão somente no dia 11/03/2020, e assim, por decisão da comissão, foi deferido prazo suplementar para entrega da defesa final, até o dia 26/03/2020;
III – Em que pese à dilação do prazo solicitado, até o dia 27/03/2020 não foi realizado o protocolo da defesa final;
IV – Em arremate, no dia 27/03/2020, por decisão da comissão foi enviado e-mail a investigada e a seu defensor, bem como mensagem via WhatsApp a investigada para entrega da defesa final até 29/03/2020, prazo este que também não foi apresentada referida defesa;
V – Deste feito, visando o direito da ampla defesa e do contraditório, a comissão sindicante, entendeu por bem, intimar o Gestor do Ente Público, no sentido de providenciar a contratação de um defensor dativo para oferecer em 10 dias úteis, a defesa final da parte investigada.
Diante dos fatos acima relatados, a dúvida ora objeto da presente consulta paira sobre a possibilidade de efetuar a contratação do defensor dativo para o caso em questão, onde, permitimo-nos solicitar a emissão de um breve pronunciamento, podendo a resposta ser encaminhada através do e-mail assessoria@dobrada.sp.leg.br.
Conclusão:
- DA CONSULTA FORMULADA
Trata-se de consulta que versa sobre a possibilidade de contratação de defensor dativo para oferecer defesa final em processo administrativo disciplinar em que a parte investigada deixou de apresentar defesa nos prazos estabelecidos no PAD.
- CONSIDERAÇÕES GERAIS SOBRE O PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPINAR
Primeiramente, cumpre esclarecer que, em consulta realizada junto ao portal eletrônico do órgão Consulente, este Centro verificou que o regime jurídico adotado pelo Município é o da Consolidação das Leis do Trabalho, bem como que inexiste, no âmbito municipal, Lei específica regulamentando o processo administrativo disciplinar aos servidores celetistas. Dessa forma, entendemos pertinente tecer as considerações abaixo.
O Processo Administrativo Disciplinar constitui no instrumento utilizado na regra como próprio para viabilizar aplicação de sanções disciplinares no âmbito da Administração Pública direta, autarquia, ou nas fundações públicas.
Nos dizeres de Antônio Carlos Palhares Moreira Reis “é o mecanismo estabelecido na lei para o controle das atividades dos servidores, no que concerne ao descumprimento de suas obrigações, ao desrespeito às proibições e à realização de fatos capituláveis como crimes ou contravenções, pela legislação penal ou por leis especiais, com reflexo no âmbito administrativo” (Antônio Carlos Palhares Moreira Reis, Processo disciplina, Brasília: Consulex, 1999, p. 100).
Assim, o PAD é o meio pelo qual se apura as faltas graves dos servidores públicos e demais pessoas sujeitas ao regime funcional da Administração, punindo-os por meio de comissão constituída por três servidores estáveis, sendo que um deles deve presidi-la.
Hely Lopes Meirelles, em sua obra Direito administrativo Brasileiro, 32ª edição, 2006, esclarece:
“Desde a citação acusatória deverá ser facultado ao indiciado, ou ao seu advogado, o exame dos autos na repartição, para a apresentação de defesa e indicação de suas provas no prazo regulamentar, possibilitando-lhe o acompanhamento de toda instrução. Nesse conhecimento da acusação, com oportunidade de contestação, apresentação de contraprovas e presença nos autos instrutórios, é o que consubstancia a ampla defesa assegurada pela Constituição (art. 5º, LV) e sem a qual é nulo o julgamento condenatório. Essa garantia constitucional entende-se a todo e qualquer procedimento acusatório – judicial ou administrativo- e se consubstancia no devido processo legal (due processo of law), da prática geral nos Estados de Direito. É moderna tendência da jurisdicionalização do poder disciplinar, que impõe condutas formais e obrigatórias para garantias dos acusados contra arbítrios da Administração, assegurando-lhes não só a oportunidade de defesa como a observância do rito legalmente estabelecido para o processo.”
Assim, a Constituição Federal vigente, ao tratar Dos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos, em seu art. 5°, inciso LV, enuncia que:
"LV – aos litigantes em processo judicial ou administrativo e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes."
O exercício do contraditório e da ampla defesa supracitada deve obrigatoriamente ocorrer dentro do processo, seja ele judicial ou administrativo, estabelecendo que não é um processo qualquer, mas o devido processo legal, conforme estatui a Constituição Federal de 1988 no art. 5°, inciso LIV.
A Constituição Federal de 1988 estabelece os mais diversos institutos que possuem grande repercussão na área do processo administrativos disciplinar, tais como: o Devido Processo Legal, estatuído no art. 5°, LIV da Constituição Federal; o Direito de ampla defesa, regido pelo art. 5°, LV, da Constituição Federal; o Direito de certidão, fulcrado no art. 5°, XXXIV, alínea "b", da Constituição Federal; o habeas corpus, estabelecido no art. 5.°, LXVIII da CF/88; o Mandado de Segurança, consubstanciado no art. 5°, LXIX da CF/88; o Controle externo de legalidade, externada no art. 5°, XXXV da CF/88; e, a Pena de demissão art. 41, § 1°, I, da CF/88.
Dessa forma, no que diz respeito aos Princípios Administrativos que são aplicáveis ao Processo Administrativo Disciplinar, estão basicamente estatuídos no caput do artigo 37 da Carta Constitucional de 1988, tais como:
· Princípio da Legalidade: base de qualquer atividade da Administração Pública, cumpridora dos mandamentos da lei, somente podendo realizar o que nela é expressamente permitida, qualquer ação fora dela, sem correspondente amparo legal, tonar-se-á injurídica e passível de anulação, respondendo pelo ato ilegal o seu autor. Ao particular é permitido fazer tudo que nela não seja proibido.
· Princípio da Impessoalidade: extraímos que a atividade da administração é destinada a todos os seus administrados, não podendo ser interferidos por valores ou sentimentos pessoais, ou com o objetivo de beneficiar uma pessoa, com isso, nos procedimentos disciplinares a autoridade designada para apurar não deve misturar o seu interesse pessoal com a entidade da Administração.
· Princípio da Moralidade: demonstra que qualquer ato da administração além de ser conforme a legislação, deverá ser moral, pois nem todo ato legal é moral, como por exemplo, instaurar uma sindicância ou um processo administrativo disciplinar indevido, com o desiderato de vingança da autoridade instauradora.
· Princípio da Publicidade: todo ato da administração pública deverá ser publicado em Imprensa Oficial ou Jornal de grande circulação, pois a administração pública deve dar conhecimento de seus atos aos interessados e também para que surtam os efeitos legais. Quanto aos procedimentos disciplinares, a partir da publicação da portaria instauradora é que dar-se-á início aos atos da comissão sindicante ou processante, tais como: prazo de recurso, prazo prescricional, etc.
· Princípio da Eficiência: introduzido na Carta Magna com a Emenda Constitucional n° 19 do ano 1998, estabeleceu que todo ato da administração pública deve surtir efeito, buscando-se resultados cada vez mais eficazes.
· O Princípio da ampla defesa e do contraditório são garantias estabelecidas na nossa Carta Magna, possuindo cada um deles, papel específico. O contraditório é a oportunidade oferecida ao acusado para que ele possa se defender dos fatos que lhe são imputados; a ampla defesa é a oportunidade que deve ser conferida ao acusado para que ele demonstre de qualquer forma legal, a inverdade dos fatos a ele imputado. Não sendo, portanto, mera entrega de uma peça escrita, com as justificativas do acusado. A ampla defesa traz em seu conteúdo o direito de manifestação, informação e a ter as suas razões consideradas.
Além dos citados princípios, destacamos que outros dois fundamentos podem ser aplicados para a instauração do PAD: o formalismo ponderado e o principio da verdade material.
· O Formalismo ponderado pode ser entendido como um princípio decorrente do principio da eficiência, o qual baseia-se na premissa de que a formalidade, não obstante necessária, não pode servir de óbice às finalidades que justificam o procedimento.
· O Principio da verdade material representa a o dever do administrador publico valer-se da efetiva verdade real diante de uma situação concreta. Trata-se de um principio decorrente do principio do interesse publico, haja vista que a administração, uma vez vinculada a esse princípio, não pode ignorar fatos que conhece, sob a alegação de que tais elementos fáticos não constam dos autos. (disponível em https://www.migalhas.com.br/depeso/8323/principios-do-processo-administrativo, acesso em 17/02/2020)
Dessa forma, diante da situação apresentada, a titulo de complementação, este Centro de Estudos entende que o Município não poderá aplicar a Lei 8.112/90 como fundamento do processo administrativo disciplinar para apuração de eventual falha do empregado publico em questão, uma vez que a citada lei tem aplicação restrita aos servidores estatutários.
Nesse sentido:
TRT-PR-03-06-2011 EMPREGADO MUNICIPAL REGIDO PELA CLT. CANCELAMENTO DO REGISTRO DE ADVERTÊNCIA DA FICHA FUNCIONAL. APLICAÇÃO ANALÓGICA DO ART. 131, DA Lei 8.212/91. IMPOSSIBILIDADE. A lei 8112/90, instituiu o "Regime Jurídico dos Servidores Publicos Civis da União, das autarquias, inclusive as em regime especial, e das fundações públicas federais", não se aplicando, ainda que por analogia, aos empregados municipais, regidos pelo regime celetista, hipótese dos autos. Não se trata, no caso, de aplicação da lei à fato semelhante, eis que se tratam de relações reguladas por regimes jurídicos distintos, cujas normas não se comunicam. Assim que não se pode adotar em relação aos empregados municipais celetistas normas que dizem respeito especificamente ao servidor público federal, apenas sob alegação do empregador, no caso, se tratar de ente público. Recurso ordinário da parte autora ao qual se nega provimento. (TRT9 – 2213201024907, PR 2213-2010-24-9-0-7, Órgão Julgador: 3A. TURMA, Publicação: 03/06/2011, Relator: ARCHIMEDES CASTRO CAMPOS JÚNIOR) (grifo nosso)
Assim, o fundamento a ser utilizado pelo órgão consulente deve basear-se no 5º, inciso LV, da CF/88, além dos princípios acima citados, sendo imprescindível a instauração do procedimento administrativo disciplinar, conforme entendimento do Tribunal Superior do Trabalho:
RECURSO ORDINÁRIO EM AÇÃO RESCISÓRIA PROPOSTA CONTRA DECISÃO TRANSITADA EM JULGADO NA VIGÊNCIA DO CPC/1973. ECT. DISPENSA IMOTIVADA. NULIDADE DO ATO DEMISSÓRIO. REINTEGRAÇÃO. TESE JURÍDICA FIXADA EM REGIME DE REPERCUSSÃO GERAL PELO STF NO JULGAMENTO DOS EMBARGOS DECLARATÓRIOS NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO 589.998/PI.
O eg. TRT da 1ª Região julgou improcedente à ação rescisória do autor, por entender que o empregado público pode ser dispensado sem motivação. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 589.998 em 20/3/2013, havia decidido ser inválida a dispensa de empregados públicos sem motivação na Administração Pública. No julgamento dos embargos de declaração opostos pela ECT, nos autos deste processo, em acórdão publicado no DJE de 5/12/2018, o Supremo Tribunal Federal fixou a tese jurídica de que apenas "a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos - ECT tem o dever jurídico de motivar, em ato formal, a demissão de seus empregados". Ressaltou, ainda, que "não é possível impor-lhe nada além da exposição, por escrito, dos motivos ensejadores da dispensa sem justa causa", afastando a exigência de instauração de processo administrativo ou de abertura de prévio contraditório. No caso dos autos, a controvérsia cinge-se, especificamente, a dispensa de empregado da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos, objeto específico da tese de repercussão geral, firmada pelo STF no julgamento dos embargos de declaração no recurso extraordinário - 589.998/PI. Dessa forma, justifica-se impor à ré-ECT, reclamada no processo matriz, a tese jurídica firmada de que a despedida dos seus empregados deve ser precedida de efetiva motivação, nos termos do artigo 37, caput, da Constituição Federal. Despedida que se declara nula com determinação de retorno ao emprego, com pagamento de todas as vantagens e diferenças salariais, desde o afastamento até a reativação do empregado. Precedentes. Recurso ordinário conhecido e provido . (TST - ProcessoRO 5235-13.2011.5.01.0000, Subseção II Especializada em Dissídios Individuais, Relator: Maria Helena Mallmann, Publicação: DEJT 16/08/2019) (grifo nosso)
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. EMPREGADO CELETISTA. ADMISSÃO ANTERIOR À CONSTITUIÇÃO DE 1988. NÃO DETENTOR DA ESTABILIDADE PREVISTA NO ARTIGO 19 DO ADCT. DISPENSA IMOTIVADA. VALIDADE.
De fato, houve equívoco do acórdão embargado ao consignar que os todos os arestos colacionados seriam inespecíficos. No entanto, o recurso de revista não merece provimento. Com efeito, após o julgamento do Recurso Extraordinário 589.998/PI, com repercussão geral reconhecida, não subsiste o entendimento de que inexiste a necessidade de motivação para a dispensa de empregado público. A motivação é necessária mesmo para aqueles empregados que não possuem a estabilidade prevista no art. 19 do ADCT. Há precedentes. Incidência da Súmula 333 do TST. Embargos de declaração providos para sanar omissão, sem importar em efeito modificativo no julgado. fls. PROCESSO Nº TST-ED-RR-364-18.2011.5.15.0042 Firmado por assinatura digital em 03/10/2018 pelo sistema AssineJus da Justiça do Trabalho, conforme MP 2.200-2/2001, que instituiu a Infra-Estrutura de Chaves Públicas Brasileira. (TST – Processo ED-RR 364-18.2011.5.15.0042, PublicaçãoDEJT 05/10/2018)
RECURSO ORDINÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA AJUIZADA SOB A ÉGIDE DA LEI Nº 5.869/1973. 1. AÇÃO RESCISÓRIA. MUNICÍPIO DE CARIÚS. ANULAÇÃO DA CONTRATAÇÃO. AUSÊNCIA DE PROCESSO ADMINISTRATIVO. CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA. ART. 485, V, DO CPC/73. VIOLAÇÃO DO ART. 5º, LV, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. CARACTERIZAÇÃO. 1.1. A validade do ato de despedida de servidor público celetista da administração pública direta, autárquica ou fundacional, admitido por concurso público, imprescinde de motivação. 1.2. A observância do princípio constitucional da motivação visa a resguardar o empregado de possível quebra do postulado da impessoalidade por parte do agente estatal investido no poder de dispensar. 1.3. Sob o viés da impessoalidade, clara manifestação se verifica no art. 37, II, da Carta Maior, ao exigir que o ingresso em cargo, função ou emprego público dependa de concurso público, exatamente para que todos possam disputar o certame em condições de igualdade. Entende-se que, com igual razão, em atenção à diretriz da motivação dos atos administrativos, para a despedida de empregados públicos concursados, deve-se exigir ato motivado para sua validade. 1.4. Nesse contexto, compreende-se pela necessidade de ato motivado para dispensa do servidor público celetista concursado. Precedentes do STF, do STJ e desta Corte. 1.5. Contudo, à evidencia de que a reclamante não é detentora da estabilidade prevista no art. 41 da Constituição Federal, impõe-se o parcial provimento do recurso ordinário, para, em juízo rescisório, fixar-se o restabelecimento do contrato de trabalho, com o pagamento das parcelas salariais durante o período de afastamento, sem prejuízo de que o Município promova a dispensa da empregada, se entender cabível, desde que observado o regular procedimento administrativo em que garantidos o contraditório e a ampla defesa. 2. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. Nos termos do item II da Súmula 219 desta Corte, "é cabível a condenação ao pagamento de honorários advocatícios em ação rescisória no processo trabalhista". Recurso ordinário em ação rescisória conhecido e parcialmente provido. (TST - Processo:RO - 5997-27.2012.5.07.0000, Subseção II Especializada em Dissídios Individuais, Relator: ALBERTO LUIZ BRESCIANI DE FONTAN PEREIRA, Publicação: 31/03/2017) (grifo nosso)
RECURSO DE REVISTA . DEMISSÃO DE SERVIDOR PÚBLICO ADMITIDO MEDIANTE PRÉVIA APROVAÇÃO EM CONCURSO PÚBLICO. REGIME CELETISTA. ESTÁGIO PROBATÓRIO . SINDICÂNCIA IRREGULAR. SÚMULAS 126 E 333, DO TST E ART. 896, § 4º, DA CLT. A demissão de servidor celetista da Administração Pública direta, autárquica e fundacional, ainda que durante o estágio probatório, deve ser realizada por meio de regular procedimento administrativo que vise apurar a ocorrência de falta grave. Do quadro fático delineado pelo Regional, observa-se que a demissão do empregado foi considerada nula em razão de ter sido precedida de irregular processo de sindicância. Desse modo, a decisão recorrida encontra-se em consonância com a atual, iterativa e notória jurisprudência desta Corte. Recurso de revista não conhecido. (TST - Processo:RR - 82800-16.2005.5.15.0019, 8ª Turma, Relator: MÁRCIO EURICO VITRAL AMARO, Publicação: 17/08/2012) (grifo nosso)
Assim, tendo em vista o Município Consulente não possuir Lei específica que regula o Processo Administrativo Disciplinar dos servidores regidos pela CLT, entendemos que o fundamento a ser utilizado pelo órgão consulente deve basear-se no 5º, inciso LV, da CF/88, além dos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, eficiência, ampla defesa, formalismo ponderado e o principio da verdade material.
Destaca-se que a instauração do processo administrativo disciplinar é imprescindível, devendo ser garantido e observado em todo procedimento os princípios constitucionais, em especial o do contraditório e a ampla defesa. Essas garantias constitucionais devem estar presentes em qualquer processo (judicial ou administrativo). Cumpre salientar, ainda, que a portaria que instituir a comissão processante deve mencionar o fundamento adotado.
- DA REVELIA NO PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR E DA POSSIBILIDADE DE CONTRATAÇÃO DE ADVOGADO PARA APRESENTAR DEFESA DO INDICIADO
Após, discorrermos sobre o Processo Administrativo Disciplinar e os Princípios que o cercam, passaremos agora a esmiuçar a matéria sobre a defesa do indiciado.
O jurista José Armando da Costa discorre de forma brilhante sobre o ato de defesa:
“em qualquer quadra ou momento da vida, o ato de defesa não é apenas um direito natural ou constitucional, é bem mais que isso, revelando-se insofismavelmente como o esforço humano que enobrece o indivíduo e o reconhece como digno de integrar o processo que a humanidade lhe conferiu, além de configurar o traço mais proeminente e característico de toda uma civilização”.
(José Armando da Costa. Teoria e prática do processo administrativo disciplinar. Brasília: Brasília Jurídica, 1999, p. 107)
Esclarecemos que o Superior Tribunal de Justiça possui jurisprudência no sentido de que, em face dos princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório, aplicáveis também na esfera administrativa e que têm por escopo propiciar ao servidor oportunidade de oferecer resistência aos fatos que lhe são imputados, é obrigatória a presença de advogado constituído ou de defensor dativo no processo administrativo disciplinar.
Assim, conforme esclarecido pelo Consulente, a servidora investigada possui procurador constituído nos autos do PAD, o qual, após pedido de dilação do prazo para apresentação da defesa final, não se manifestou apesar das notificações por e-mail e mensagens via Whatsapp, tanto ao procurador constituído quanto à investigada.
Nesse ponto, tendo em vista a revelia da investigada e sobre a possibilidade de contratação de advogado para apresentar defesa final, cumpre salientar que os serviços jurídicos do poder público serão prestados, ordinariamente, por servidores efetivos selecionados mediante concurso público, nos termos do art. 37, II, da Constituição da República. De modo extraordinário, nos casos previstos na própria Carta Política, e em face da regulamentação legal quanto às hipóteses, tolera-se que tais serviços sejam prestados por servidores ocupantes de cargos de provimento em comissão ou admitidos temporariamente por prazo determinado em razão de necessidade de excepcional interesse público.
A terceirização dos serviços jurídicos também possui caráter excepcional, e somente pode ser admitida quando da impossibilidade ou incapacidade de o quadro jurídico da Administração satisfazer a situação requerida. Uma vez justificada a terceirização, deve ela se restringir à prestação de serviços, não sendo aceita a terceirização de mão-de-obra, por representar burla à exigência constitucional de acesso ao serviço público pela via do concurso.
Tal contratação atenderá, obrigatoriamente, as normas da Lei nº 8.666/93, submetendo-se a procedimento licitatório. A exigência reside no ordenamento jurídico em patamar constitucional, estabelecendo o art. 37, XXI, que as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, ressalvados os casos especificados na legislação.
As situações de inexigibilidade, em face da combinação do art. 25, II, e do art. 13 da Lei nº 8.666/93 (serviços técnicos especializados) requerem antes de tudo a inviabilidade de competição, concretizada pela singularidade do objeto, isto é, seu caráter único.
Para a contratação dos serviços, deve-se atender ao requisito da notória especialização do prestador. Esta qualidade não se confunde com a especialização no campo de atuação, mas capacidade diferenciada para prestar o serviço de natureza singular, a ser demonstrada pela atuação anterior, formação acadêmica, publicações pertinentes ou outros meios que demonstrem ser o profissional contratado possuidor de credenciais que permitam supor sua capacidade de satisfazer a necessidade da Administração.
Destarte, não há como caracterizar a notória especialização no caso concreto, uma das hipóteses de dispensa de licitação da Lei 8.666/1993. Tal caracterização restringe-se a casos peculiares, impossíveis de serem confundidos com a contratação pretendida.
Na mesma esteira, decidem as Cortes de Contas:
Tribunal de Contas de Santa Catarina
Origem:
Relator: Auditora Thereza Apparecida Costa Marques
Processo n. TC 9480611/98
Parecer n. COG-377/00
Decisão: 2483/00
Sessão: 23.08.2000
“1.Quanto à contratação de advogado ou serviços jurídicos, deve ser considerado o seguinte:
a) tendo os serviços jurídicos, incluída a defesa judicial ou extrajudicial dos interesses do Município, natureza de atividade administrativa permanente e contínua, é recomendável que haja o correspondente cargo efetivo no quadro de servidores do Município para atender tal função, com provimento mediante concurso público (art. 37 da Constituição Federal);
b) é cabível a contratação de profissional do ramo de direito, desde que devidamente justificada para atender específicos serviços (administrativo ou judicial) que não possam ser realizados pela assessoria jurídica dada a complexidade e especificidade, configurando necessidade dos serviços de profissional (jurista) de notória especialização, hipótese em que a contratação, por inexigibilidade de licitação, se dará nos termos do art. 25, II. Parágrafo 1º , combinado com o artigo 13, V e § 3º , e 26 da Lei Federal 8.666 de 21.06.93, ou por dispensa de licitação quando atendidos os requisitos do art. 24, II, e 26 da Lei de Licitação;
c) para suprir a falta transitória de titular do cargo de advogado (ou outro equivalente), poderá o Município contratar profissional, temporariamente, até que haja o devido e regular provimento, segundo foi regulado em lei municipal específica, inclusive quanto ao prazo, nos termos do inciso IX do art. 37 da Constituição Federal, ou, ainda, contratar serviços jurídicos através de processo licitatório;
d) quando não houver cargo de advogado ou equivalente na estrutura administrativa do Município, para atender os serviços jurídicos gerais é admissível, até a criação de cargo e respectivo provimento: a contratação de profissional em caráter temporário, mediante autorização por lei municipal específica, inclusive quanto ao prazo, nos termos do inciso IX do art. 37 da Constituição Federal, ou a contratação de prestação de serviços jurídicos, através de processo licitatório, na Forma da Lei Federal n. 8.666/93.”
Tribunal de Contas de Santa Catarina
Origem:
Relator: Conselheiro Antero Nercolini
Processo n. TC 1441001/93
Parecer n. COG-144/99
Sessão: 05.07.1999
“É cabível a contratação de profissional do ramo de direito, pela Câmara Municipal, desde que devidamente justificada para atender serviços que não possam ser realizados pela assessoria jurídica, dada a sua complexidade.
Para a contratação de serviços advocatícios destinados ao assessoramento da Câmara de Vereadores, deve o Poder Legislativo instaurar o devido processo licitatório, nos termos do inciso XXI do art. 37 da Constituição Federal, e dos arts. 1º e 2º da Lei Federal n. 8.666/93.
A licitação poderá ser dispensada ou inexigível, caso sejam atendidos os requisitos insertos, respectivamente, no inciso II do art. 24 ou no inciso II, combinado com o §1º do art. 25 da Lei Federal n. 8.666/93.
Havendo a contratação direta deverá ser observado o disposto no art. 26 da Lei Federal n. 8.666/93.”
Consulta n. 688701 TCE/MG
Em síntese, é necessário ressaltar que o entendimento desta Corte sobre a contratação de serviços advocatícios pela Administração Pública [...] é de que se deve observar, em princípio, a regra geral contida na Lei n. 8.666/93, que é licitar e, em caso específico, o disposto em seu art. 25, que remete para o art. 13, no qual estão catalogados os serviços técnicos, entre eles, os serviços advocatícios. Este Tribunal considera que nem todos os serviços advocatícios podem ser considerados singulares; aliás, poucos têm esta característica. Somente as causas que, por sua complexidade, ou pelo montante isolado que cada uma representa, ou circunstância especial, marcante para a população ou para a administração pública, revestem-se desse caráter singular. Se estão no dia-a-dia da administração, não podem ser considerados eventuais, mas sim serviços rotineiros, ou seja, aqueles que podem ser prestados pela esmagadora maioria de advogados e são passíveis de licitação. Assim, não basta que o serviço esteja listado no art. 13; é necessário que seja singular. [...] Ressalte-se, também, que a confiança do administrador não é fator caracterizador da inexigibilidade. Pelo contrário, o que deve nortear a sua escolha é o interesse público que alcança toda a coletividade, portanto, impessoal. (Rel. Conselheiro Elmo Braz Soares. Sessão do dia 15/12/2004) (Grifo nosso)
Nos dizeres do jurista Marçal Justen Filho:
“Cargo público de provimento efetivo é aquele cujo provimento depende de um concurso e que apresenta um regime jurídico destinado a permanecer ao longo do tempo, podendo produzir a aposentadoria do seu titular.”
(Marçal Justen Filho. Curso de Direito Administrativo. 2ª edição. São Paulo: Editora Saraiva, 2006, p. 622.)
Concluímos que os serviços jurídicos da administração pública serão prestados, em regra, por servidores efetivos selecionados mediante concurso público, como impõe o art. 37, II, da Constituição Federal e apenas excepcionalmente, nas hipóteses previstas pela nossa Carta Maior, nos casos de servidores em cargos comissionados ou admitidos temporariamente por prazo determinado admitido em razão de necessidade de excepcional interesse público.
- CONCLUSÃO
Diante do exposto, este Centro de Estudos conclui que, por não tratar-se dos casos extraordinários previstos na constituição, muito menos de necessidade de excepcional interesse público, mas sim, de serviço corriqueiro da Edilidade, obrigatória se faz a realização da defesa da investigada no referido Processo Administrativo pelo quadro de Advogados permanentes da Prefeitura ou por sua Assessoria Jurídica.
Ademais, salienta-se que no caso concreto, como se trata de Processo Administrativo Disciplinar e não existe a obrigatoriedade de defesa técnica (sumula vinculante nº 5 do STF), pode ser designado qualquer funcionário da Edilidade que se incumba da defesa do indiciado.
Dessa forma, após a juntada aos autos do processo administrativo do certificado de revelia (bem como do AR e/ou mensagens enviadas à investigada e seu procurador), a autoridade processante, visando evitar eventuais arguições de nulidade do processo no que tange à materialização das garantias constitucionais, deve designar advogado ou funcionário integrante do quadro de funcionários da edilidade, sendo dado a este, prazo concernente à defesa final.
Não obstante, o Município poderá oficiar à OAB local solicitando a indicação de advogado da Assistência Judiciária ou à própria Defensoria Pública, para apresentar defesa do servidor, se for o caso.
É o Parecer!
A.P.S.
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