Série DPU na COP30 | Xingu: DPU atua para garantir gestão de balsa pelo povo Mebêngôkre
Brasília - Centro de um debate no início da década de 80, a balsa 'Estradeiro I' e o rebocador 'Estradeiro II' voltaram à pauta quase 40 anos depois. Desde 1984, graças a um acordo firmado entre o governo federal e o povo Mebêngôkre/Kayapó, a Terra Indígena Capoto Jarina mantinha como uma de suas fontes de renda a travessia de veículos por balsa no rio Xingu, em uma área que abrange os municípios de Peixoto de Azevedo, Santa Cruz do Xingu e São José do Xingu.
Passadas quase quatro décadas do acordo, em 2021, o Ministério Público Federal (MPF) propôs uma Ação Civil Pública (ACP), requerendo que a operação e a manutenção da balsa e do rebocador ficassem sob posse do governo estadual. O MPF alegou que a falta de manutenção apresentava riscos aos usuários e obteve decisão favorável. Vale destacar que as lideranças Mebêngôkre já tinham feito diversos pedidos para que o governo do Estado de Mato Grosso realizasse os reparos necessários.
Foi nesse contexto que a Defensoria Pública da União (DPU) passou a atuar no caso. Esta é a sétima matéria da série especial 'DPU na COP30: Justiça Climática é Direito', lançada pela Assessoria de Comunicação Social (Ascom) da DPU, em 25 de agosto, que conta como a Instituição esteve presente na defesa destes guardiões da biodiversidade, tão essenciais para que o planeta sobreviva à emergência climática e, ao mesmo tempo, um dos grupos que mais sofrem com os impactos das mudanças do clima.
Guerra da Balsa, um contexto histórico de memória e resistência
Comandada pelo Cacique Raoni Metuktire, uma das mais importantes lideranças indígenas do mundo, a chamada ‘Guerra da Balsa’ ocorreu em 1984 e foi determinante no processo de demarcação da Terra Indígena Capoto Jarina, tradicionalmente ocupada pelo povo Mebêngôkre.
Em fevereiro daquele ano, Raoni se reuniu com representantes da então Fundação Nacional do Índio (atual Fundação Nacional dos Povos Indígenas/Funai), em Brasília, para reivindicar a demarcação de suas terras. Na ocasião, ele afirmou que, caso a Terra Indígena Capoto Jarina não fosse demarcada até abril de 1984, os Kayapó passariam a agir por conta própria.
Representantes da Funai e do Parque Indígena do Xingu (atual Terra Indígena Xingu) acenaram com reuniões que não chegaram a acontecer. Por ocasião de uma delas, agendada para 24 de março, às vésperas do encontro proposto, o cacique Raoni fez contato por rádio com a Funai, a fim de saber o horário em que pousaria o avião do presidente da Fundação. Foi informado que ele não iria mais encontrá-los.
Diante da falta de diálogo, os indígenas das etnias Kayapó, Kayabi, Juruna e Suya, ainda no contexto de ditadura militar, capturaram a balsa que faz a travessia do rio Xingu e dá acesso à antiga BR-080, atual MT-322, importante via de escoamento de produtos no norte de Mato Grosso.
A ação, que durou 40 dias, resultou na demarcação da Terra Indígena Capoto Jarina e na administração da balsa pelos Kayapó, um acordo firmado em 4 de maio de 1984 entre as lideranças Mebêngôkre e o Ministério do Interior.
Atuação da Defensoria Pública da União
A atuação da DPU começou com o pedido de reconsideração da decisão judicial que deu ao governo estadual a operação e a manutenção da balsa e do rebocador, como resultado da ACP proposta pelo MPF em 2021. A Defensoria entrou no processo como litisconsorte passivo.
No requerimento, o defensor regional de Direitos Humanos no Mato Grosso (DRDH-MT), Renan Vinícius Sotto Mayor, destacou que o local onde é realizada a travessia com a balsa é território indígena e que a ação em referência não mencionava tal fato.
O defensor público federal apontou ainda que a importância histórica e de subsistência da balsa para os Kayapó não havia sido levada em consideração e que os indígenas não tinham sido incluídos no processo como polo passivo. Renan ressaltou que a inclusão apenas da Funai, da Marinha do Brasil e do governo do estado de Mato Grosso reforçava a invisibilidade de um povo historicamente alvo de graves violações de direitos humanos.
Escuta ativa, intermediação e construção de consenso
Em 28 de maio de 2021, o defensor público federal esteve na aldeia Piaraçu, uma das mais importantes da Terra Indígena Capoto Jarina e onde vive o cacique Raoni Metuktire, para intermediar o diálogo entre as lideranças Kayapó com o MPF e o governo de Mato Grosso. Por meio da escuta ativa e da essencial articulação do cacique Raoni, a Defensoria Pública da União conseguiu a construção de consenso.
“Essa foi uma atuação muito importante. Nós conseguimos que a balsa fosse restaurada e devolvida para os indígenas e fizemos um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), que foi assinado pelo cacique Raoni. Conseguimos solucionar uma questão central”, declarou Sotto Mayor.
“O tema envolve um povo originário; ou seja, são pessoas que ocupam de forma tradicional e milenar este território antes do surgimento do Estado brasileiro e da Constituição de 1988, o que lhes garante uma série de direitos que devem ser respeitados”, afirmou o defensor. “Além disso, o controle das balsas possui um imenso valor simbólico para o povo Mebêngôkre na luta por seu território e é um mecanismo na proteção do meio ambiente”, completou.
Proteger os guardiões da biodiversidade é proteger o futuro do planeta
A Defensoria Pública da União segue acompanhando o caso e reafirma seu compromisso em garantir os direitos fundamentais e originários dos povos indígenas na proteção de seus territórios e modos de vida.
A DPU entende que a Justiça Climática só será possível com a defesa da autonomia destes povos, reconhecendo-os como protagonistas na proteção da biodiversidade e no enfrentamento da crise climática.
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Assessoria de Comunicação Social
Defensoria Pública da União
Por: Defensoria Pública da União
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